17/03/2012

Opinião 3


Nudoterapia em tempo integral

Nada mais natural que o Naturismo e, se viver naturalmente é algo de saudável e enriquecedor, o Naturismo tem muito a oferecer.

Sabe-se hoje – e diversos estudos foram feitos sobre o assunto – da importância de encararmos com naturalidade a nudez, de permitirmos aos nossos corpos o contacto pleno, sem barreiras, com o fluxo da vida. Tocar e deixar-se tocar. O ar, o sol, o vento, o contacto com o outro e com nós mesmos. Recomeçar. Reaprender a vida, sem preconceitos e tabus que, ao longo de séculos cercearam a nossa liberdade corporal, tolheram a espontaneidade e nos levaram a um estranhamento em relação ao próprio corpo.

Como diz A. Gaiarsa: “nossos corpos estão fechados de medo e de raiva, porque não puderam sentir felicidade nem prazer. Na verdade, porque não sabemos sentir o corpo”.
“A única terapia autêntica, profunda e genuína é recomeçar a sentir o corpo inteiro, com prazer inerente a esse sentir, prazer diverso, conforme a acção diversa, prazer diferenciado, prazer sem culpa, sem ansiedade e sem raiva”.

O processo de distanciamento em relação ao próprio corpo começa logo cedo. No berço. Impõe-se às crianças o uso de roupas inadequadas, muitas vezes desnecessárias, que limitam os movimentos, reduzem a auto-estimulação e aumentam o isolamento. É de importância fundamental repensarmos este aspecto da nossa cultura.

Os bebés gostam de ficar nus. Porquê vesti-los, mesmo quando demonstram claramente o desejo de parmanecer despidos? Irwin e Weiss, em “The Effect of Clothing and Vocal Activity of the Newborn Infant”, enfatizam que os bebés vestidos apresentam índices muito menores de actividade do que quando estão sem roupas e indagam se esta redução na actividade é decorrente da diminuição da auto-estimulação, de uma perda na recepção de estímulos externos, do possível alívio das contrações da fome ou se seria consequência da limitação mecânica imposta pelas roupas.

Em verdade, estes  quatro factores interferem, mas, possivelmente, na opinião de um outro estudioso do assunto, Ashley Montagu em “Tocar – O significado da pele humana”, o fundamental é o isolamento que as peças de vestuário representam em relação aos estímulos vindos de fora. Assim, há um distanciamento do mundo, uma restrição aos estímulos e sensações tácteis, ainda no berço.
O mesmo Montagu destaca que “uma das consequências do hábito de usar roupas desde o início da infância é que a pele deixa de desenvolver a sensibilidade que teria naturalmente, se não se tivessem usado habitualmente roupas”. E conclui: “As roupas interrompem muito a experiência das sensações agradáveis vindas da pele, por isso, a actual atitude de usar poucas roupas pode representar tentativas de gozar experiências que tenham sido anteriormente negadas”.

Porque vivem cobrindo-a de roupas, a criança, com o passar dos anos, perde aquele contacto natural que tinha com o próprio corpo, estabelece áreas proibidas de serem tocadas sem fortes sentimentos de culpa e corporifica os tabus que permeiam relações tácteis. Distancia-se do seu próprio corpo e do corpo do outro – que também é território proibido. Ou seja, carícias são negadas, afetos são reprimidos. Em contrapartida, incorpora ansiedades e temores, que se vão manifestar em tensões musculares crónicas, tão bem descritas por Reich, e que, num certo sentido, irão determinar o carácter e a percepção que terá do mundo e das coisas ao atingir a fase adulta.

É esta visão distorcida do Homem em relação ao próprio corpo e que tão cedo começa, que o Naturismo pretende mudar.
                                                                                                                                                         
O Naturismo procura enfatizar que para sermos mais ternos e amorosos antes de mais nada temos de aceitar o nosso próprio corpo, naturalmente. Se não nos amamos como poderemos amar os próximos? Se não aceitamos o nosso próprio corpo como poderemos aceitar o do outro? Se interrompemos o fluxo da vida como poderemos vivenciar as emoções plenas do viver?

Resgatar o próprio corpo, redescobrir a vida – tal é a finalidade do Naturismo.
O Naturismo é reeducação na medida em que denuncia os tabus e os preconceitos, a falsa moral, a hipocrisia e os valores negadores da vida. Cria uma nova moral ao estabelecer que todos têm direito à felicidade, que fomos feitos para sermos amoráveis  com nós próprios e com os outros.

O Naturismo é terapêutico na medida em que ele dá chances de “ficar bem com o seu próprio corpo”, uma vez que ele permite redescobrir e vivenciar plenamente os estímulos e sensações tácteis que foram negadas à sua pele. Ao tirar a roupa está igualmente a despojar-se dos papéis e das “posições sociais”, igualando-se aos demais. Dá-lhe a oportunidade de questionar a vida por inteiro, as relações estabelecidas com os que lhe estão próximos e com a Natureza. Ver e aceitar as pessoas como elas realmente são, descobrindo que a beleza não se restringe aos corpos padronizados pelas revistas e TV’s.

Alex Comfort, em “ABC do Amor e do Sexo”, nos diz: “É lamentável que nos tenham ensinado a sentir vergonha do corpo nú. Uma pessoa nua sente-se bem e o seu aspecto é agradável; até as pessoas feias ficam melhores e não piores, sem roupas”
“Impedir que as pessoas fiquem nuas, ou que vejam as outras nuas, é uma industria que emprega centenas de policiais, investigadores, promotores, etc.. E isso é um absurdo!”
“Tirar a roupa na companhia de outras pessoas significa vê-las como elas realmente são, e deixar que elas vejam como você é sem artifícios”.
“Actualmente, muitos adultos andam nus em casa e não ficam se escondendo atrás de toalhas. Isso ajuda as crianças a saberem qual é o aspecto do corpo dos adultos”.
“É bem provável que, ainda nesta época em que vivemos, as pessoas deixem de criar tanta polémica em torno da nudez”.
“Os “nudistas” costumavam falar maravilhas da sensação de poder se deitar ao Sol e se bronzear por completo, afirmando que era isso que os fazia sentir tão bem”.

Certamente, esse bem estar era também provocado pelo facto de poderem livrar-se das velhas “bobagens” segundo as quais a nudez é indecente e vergonhosa.
São estes velhos conceitos que o Movimento Naturista procura descartar através de uma vivência saudável e harmónica, com o próximo e com a Natureza. O Naturista tem por princípio não se envergonhar da obra do Criador.
Aceita o corpo do Homem, feito “à sua imagem e semelhança”, sem restrições e julga reflectir, assim, o anseio da humanidade por uma vivência mais plena.
Este é o grande valor terapêutico da prática naturista.

“A expansão do movimento nudista reflecte certamente o desejo de maior liberdade e comunicação por meio da pele. É muito interessante que isso assuma a forma de comunicação visual através da observação do corpo desnudo. Todos os nudistas são unânimes quando afirmam que isso reduz muito a tensão sexual e é de grande valor terapêutico geral”  , complementa A. Montagu.
A expansão do Movimento Naturista a nível mundial – hoje são 40 milhões de praticantes em todo o mundo – é a expressão de uma nova consciência que se revela e se manifesta conclamando à Vida.

Resgatar o corpo para resgatar o Homem. Resgatar o Homem para recriar a Vida.

Edson Medeiros
Sociólogo do Centro de Estudos Naturistas
NATMAG – Minas Gerais – Belo Horizonte – Brasil

Publicado na Revista "O Natural" Nº 6